Flavio R. Cavalcanti - 20 Jun. 2015Fiscalizações e auditorias do Tribunal de Contas da União (TCU) produziram farta documentação, que pode ser muito útil para um levantamento detalhado de como transcorreu o processo de recuperação do Trem de Subúrbio de Salvador pela CBTU e sua transferência para a Companhia de Transportes de Salvador (CTS), da prefeitura da capital baiana. Relatório de Levantamento de Auditoria do controle externo do TCU realizado em 2002 lembra que o programa “Recuperação do Sistema de Trens Urbanos de Salvador (BA) Trecho Calçada – Paripe” era parte do projeto do “Sistema Integrado Multimodal de Transportes da Região Metropolitana de Salvador – RMS”, abrangendo avenidas, corredores de ônibus, transporte hidroviário, Metrô e a integração desses modais, além da possível substituição do Trem de Subúrbio por um sistema de Veículos Leves sobre Trilhos (VLT) [26.783.0222.7625.0101_0220.pdf, 23/9/2002. Câmara dos Deputados].
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O Relatório também lança luz sobre a decisão de transferir o Trem de Subúrbio, da CBTU (federal) para o estado da Bahia e/ou a prefeitura de Salvador. Decorria da Lei n° 8.693 [03 Ago.1993], que autorizou a CBTU a cindir seus sistemas de transporte coletivo urbano e suburbano de passageiros, criando novas empresas e doando-as aos respectivos estados e municípios.
Essa lei foi proposta, aprovada e sancionada com base no artigo 30, inciso V, e artigo 182, “caput”, da Constituição Federal de 1988, que definem como competência municipal a organização e a prestação de serviços de transporte coletivo, bem como a política de desenvolvimento urbano.
A doação desses sistemas de transporte ficaria condicionada à prévia aceitação, em cada caso, pelos respectivos Estados e Municípios o que dificilmente aconteceria, sem que fossem recuperados, e aliviados de dívidas e obrigações (tal como as empresas preparadas para privatização, incluindo gordos reajustes prévios de suas tarifas, para torná-las atrativas à livre iniciativa).
Transferir um sistema de trens não é como virar uma bicicleta, coisa que se faz em um minuto, até num corredor estreito, basta levantar na vertical, girar e colocar de novo no chão. Da lei à execução, vai muito estudo, consultas, exame de questões jurídicas, custos, negociações entre as partes etc.
Só em 16 Jan. 1998 foi assinado convênio entre a União, o estado da Bahia e o município de Salvador, comprometendo-se todos a promover os atos administrativos, as alterações institucionais e organizacionais e a iniciativa para edição das medidas legais necessárias à efetivação da transferência do Trem Metropolitano de Salvador, operado pela CBTU, para a Companhia de Transportes de Salvador - CTS.
Pouco mais de um ano após a assinatura do Convênio, o governo federal conseguiu fechar o Acordo de Empréstimo com o Banco Mundial (Bird), em 3 Dez. 1999:
Para concretização da primeira linha do Metrô, da recuperação do Trem e de outros estudos relacionados com a restruturação dos transportes ferroviários em Salvador, foi providenciado apoio financeiro do BIRD por meio do Acordo de Empréstimo nº 4494, assinado em 03/12/99, entre a República Federativa do Brasil e o BIRD. Segundo o Acordo de Empréstimo, para melhorar a eficiência operacional e financeira de trens suburbanos e facilitar a integração com outros serviços de transporte: a União decidiu transferir a propriedade, a administração e a operação do patrimônio da CBTU para o Estado da Bahia e o Município de Salvador; o Estado e o Município aceitaram a transferência por meio de Convênio celebrado em 16/01/1998, sendo que a CTS terá a posse e a gerência do sistema; a CBTU conduzirá a reabilitação física do sistema STU-SAL, elaborando um plano para reduzir os subsídios operacionais; e o projeto será executado pela CBTU e o Município (por intermédio da CTS), com ajuda do Estado e da União, que repassará recursos do orçamento e do empréstimo para a CBTU. O empréstimo foi contratado no valor de US$ 150.000.000,00, dos quais US$ 2.200.000,00 estão alocados para os Trens Metropolitanos de Salvador, sendo US$ 1.950.000,00 para as obras de recuperação e US$ 250.000,00 para serviços de consultoria relativos ao trecho Calçada-Comércio.
Embora vistoso, US$ 2,2 milhões não eram (mesmo em 1999) nada que se pudesse dizer, Nossa!, dá para reconstruir o Trem de Subúrbio de cima a baixo. Uma guaribada, no máximo.
Somando recursos do Tesouro, previram-se R$ 20 milhões, mas até a conclusão do Relatório de Levantamento de Auditoria, em Set. 2002, as obras de recuperação ainda não tinham começado a licitação ainda estava na iminência de ser realizada e estava contratada apenas uma parte dos serviços de consultoria (Integração Trem-Ônibus).
A recuperação abrangeria a via permanente, ponte São João, sistema elétrico, estações, material rodante e implantação de 4 passarelas. Tinham sido executados, no exercício de 2001, apenas parte dos serviços de recuperação em estações, vagões e na própria via permanente, correspondendo a 6,8% do total.
Detalhes sobre os serviços contratados:
Objeto do Contrato: Serviços de reparação e recuperação de carros ferroviários de passageiros, sendo 2 carros-motor tipo ACF e um carro-reboque Pinder [GMC ADMINISTRAÇÃO E SERVIÇOS LTDA].
O Contrato originalmente firmado no valor de R$ 149.669,00 foi aditivado por quatro vezes, sendo os primeiro e terceiro aditivos de prazo e os segundo e quarto aditivos de valor e prazo.
Objeto do Contrato: Serviços de pintura geral e recuperação de esquadrias, bancos e portas e reparação de circuito elétrico para trens e Unidades elétricas, bem como fornecimento e instalação de Compressor e reparo de pantógrafo [GMC ADMINISTRAÇÃO E SERVIÇOS LTDA].
Objeto do Contrato: Serviços de manutenção preventiva e corretiva de Via permanente (incluindo pátios e devios), tais como substituição de dormentes e trilhos, substituição e limpeza de lastro, limpeza de valetas, inspeção de AMV, demolição e assentamento de AMV TR-45/37, bota-fora de material, serviços de roçagem manual (c/roçadeira) e serviços de operação e manutenção de trator no trecho ferroviário de Calçada até Paripe [MTF MANUTENÇÃO DE TERMINAIS FERROVIÁRIOS LTDA].
A recuperação do sistema de Trem do Subúrbio avançava, portanto, nos itens de menor valor, de contratação menos complicada, embora urgentes, e capazes de explicar o visível aumento no número de passageiros transportados em 2001 e 2002.
Já tinham sido abertas licitações para as obras de reforma da ponte São João e Sistema de Eletrificação, mas ambas tiveram de ser revogadas, por não comparecerem empresas que atendessem às exigências do Edital.
Nova auditoria, dois anos depois, tornava a registrar o mesmo índice de execução de apenas 6,8% do total dos serviços previstos. Nenhum andamento adicional na recuperação física do sistema.
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