Flávio R. Cavalcanti
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Espaço, tempo e dinheiro são três grandes obstáculos a um maior desenvolvimento do hobby no Brasil.
Não que muitos modelistas não possam encontrar espaço, dentro de suas casas. Muitas vezes, falta a decisão de negociá-lo politicamente, com os demais membros da família e, até, com os interesses paralelos do próprio modelista.
Também falta entender que uma boa maquete não precisa, necessariamente, comportar 20 trens enormes e 50 locomotivas de reserva.
Qualquer modelista pode construir o projeto apresentado aqui — só não o recomendo, se a pessoa for um total iniciante no hobby. Mesmo assim, tenho conhecido muitos novatos que poderiam fazê-lo logo de início, sem mais problemas do que acabaram tendo, de qualquer forma, em maquetes muito simples e totalmente planas.
Cabe numa estante, num maleiro, ou no banco de trás de um fusca e é facilmente transportada por uma pessoa. Apartamento funcional, kitinete, quarto de pensão — é difícil imaginar um local onde tal maquete seja impossível. Mas, a criatividade do modelista é proverbial, e aguardo esperançoso qualquer obstáculo que alguém ainda consiga imaginar...
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O diorama é um pequeno cenário, muito utilizado por plastimodelistas, para valorizar montagens de aviões, tanques, carros de combate etc.
No modelismo ferroviário, não é tão comum. No entanto, é uma solução inteligente, quando o modelista não tem espaço para um circuito oval — que exigiria pelo menos 80 cm de largo, se for adotada uma curva super-apertada, de 36 cm de raio. Para locomotivas diesel de 12 ou 16 rodas (C-C e D-D), carros longos e diversas locos a vapor — principalmente americanas —, curvas assim podem ser um desastre físico (CO-2/3, CT-1/4) ou, pelo menos, um ridículo visual.
No meu caso, mesmo curvas de raio = 36 cm (grades 4188 Frateschi) não eram uma opção.
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O Centro-Oeste, com todo seu equipamento, estoques e arquivos, encontra-se confinado num cômodo de 2,90 x 3,45 metros, juntamente com todo meu material de modelismo ferroviário e minha biblioteca geral. Duas estantes ocupam duas paredes até o teto; a terceira parede é uma janela por onde entra chuva a rodo; e a quarta parede é ocupada por duas escrivaninhas com prateleiras, gavetas e escaninhos até cerca de 1,70 metro de altura — sendo uma delas suficiente apenas para o computador, impressora, monitor, disketes, manuais e listagens.
Para meu gosto, estavam descartadas alternativas tais como: maquete de pendurar no teto (cordas e roldanas), maquete de guardar num lugar e usar em outro etc. Adquiri um gosto todo especial por maquetes que ficam exatamente onde estão, com os trens nos trilhos.
Após a última reorganização, consegui obter um espaço de 97 x 44 cm numa das estantes — aliás, nem todas as estantes chegam a oferecer 44 cm de fundo. Como as prateleiras podem ser dispostas de 5 em 5 cm — e prefiro maquetes tridimensionais —, abri um espaço de 58 cm de altura.
Era o suficiente para mim, que curto especialmente o maquetismo, dentro do hobby, e desde meados de 86 estava sem nenhuma mini-ferrovia.
Decidi que a maquete não seria fixa, podendo ser retirada da estante para construção e/ou reparos — é muito melhor trabalhar numa mesa —, e o trafo (CT-5100 Frateschi) seria embutido na estrutura. Atrás da estante, foi instalada uma tomada dupla, sendo uma saída de força exclusiva para a mini-ferrovia [FOTO].
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Minha técnica de projeto, principalmente quando disponho de pouco espaço, é começar pelo traçado — mesmo que tenha idéias definidas quanto ao relevo.
Não, não se apavore quando falo "minha técnica" — poderia, igualmente, dizer "minha incapacidade de fazer de outro modo". Não posso falar pelos espertos, que disfarçam seus pontos fracos e se apresentam seguros e bem-sucedidos (é uma atitude sábia e rentável) mas, no interesse do leitor, convém frisar que — pelo menos eu — trabalho pela linha da menor dificuldade. É prático.
Num espaço tão pequeno, o melhor aproveitamento começa pelo uso da diagonal — é a maior reta que você pode obter num retângulo.
Concentrar 2 AMVs reversos, no centro desta nesta diagonal, é a forma mais econômica (em termos de espaço) para instalar 2 pátios (ramais) em cada direção, com um mínimo de espaço para uma locomotiva pequena ainda conseguir transferir 1 ou 2 vagões pequenos, de um para outro pátio.
Depois, você pode acrescentar mais 1 ou 2 AMVs — e mais 1 ou 2 pátios adicionais —, conforme o espaço disponível, sempre imitando um asterisco, com as linhas brotando da área central.
Por fim, encurve algumas linhas, cada uma de uma forma diferente, para obter uma aparência irregular e variada.
O desenho básico me tomou menos de um mês, trabalhando poucas horas por semana, no segundo semestre do ano passado — isto é algo que faço sem pressa. Por mais simples que pareça o resultado final, a verdade é que desenhei pelo menos meia dúzia de alternativas. A última — que abandonei ao cortar o compensado para a base das linhas — previa 3 pátios à direita e 3 pátios à esquerda.
Ao recortar a madeira, decidi deixar apenas 2 pátios à esquerda, sendo um deles (à frente) sobre uma ponte. Que me perdoem os puristas, mas é sobre esta ponte que a locomotiva irá manobrar para transferir vagões entre os 3 pátios à direita. O outro pátio à esquerda (atrás) será um depósito de locomotiva.
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Antes, mesmo, de chegar ao desenho final do traçado das linhas, já havia formado uma idéia bem concreta do que seria e do que não seria possível neste espaço. A partir daí, já comecei a definir o relevo e algumas construções principais que fariam parte do projeto global.
Com 58 cm de altura disponível, decidi que as linhas — totalmente planas — ficariam a cerca de 30 cm de altura. Isto me daria cerca de 25 cm de altura (acima das linhas) para as construções e para um morro ao fundo; e outros 25 cm de altura (abaixo das linhas) para uma ponte de madeira em treliça sobre uma grota, com um córrego lá embaixo.
O pátio da frente, à direita, deverá entrar em um prédio cortado na beira da maquete, de modo que seu interior será visto em todos os detalhes. É um macete bastante comum nos EUA mas que, até hoje, nunca vi numa maquete brasileira.
O projeto deixa um espaço na frente, em forma de arco, onde o relevo irá descendo gradualmente, da direita para a esquerda, até o riacho. Nesta área, pretendo instalar uma pequena favela, conforme a dica do José Agenor na RBF-7/7: mantendo o tamanho dos barracos e reduzindo sua quantidade. Na beira do córrego, a lavanderia cheia de comadres.
Na parte de trás, o pátio da direita também deve servir a uma indústria, de modo que o pátio intermediário se perde entre 2 prédios. Mais ao fundo, a paisagem deverá subir com um morro mais ou menos abrupto, deixando algum espaço para pequenas coisas — algumas árvores, um caminhão antigo, um barraco de guardar ferramentas etc.
Para quem já viu o projeto da EF Santa Rita do Despejo (CT-3/4), não é surpresa ficar sabendo que este novo projeto também prevê uma época bem antiga, com prédios envelhecidos e vagões pequenos. Isso estica a maquete.
Para resumir, a idéia é compensar o reduzido tamanho do diorama com uma dimensão vertical imponente. Também aqui, a paisagem ascendente proporciona um aumento da profundidade. Ao invés dos 44 cm que teria em nível, passo a ter — potencialmente — até 75 cm, numa inclinação (média) superior a 40 graus.
Visualmente, espero retratar um pequeno trecho suburbano de ferrovia antiga, imprensada num espaço exíguo, entre a montanha e o vale, como costumava ver no Estado do Rio, na segunda metade dos anos 50.
Creio que o relevo, subindo mais ou menos abruptamente na parte de trás — ao invés de algum poster de paisagem a perder de vista —, evitará que o olhar procure distâncias, o que ressaltaria o tamanho acanhado da mini-ferrovia. Pelo contrário, espero que o cenário fechado dirija o olhar para os detalhes, parando nos becos que sugerem continuações desse micro-universo.
Se vou conseguir, só se vendo.
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Já tive uma mini-ferrovia onde 2 trens de 12 a 14 vagões podiam circular simultaneamente, com curvas, paisagens, subidas e descidas que até hoje dão saudades (IF-31, CO-6/6).
Sob muitos aspectos, tendia a tornar-se monótona, se durasse mais alguns anos. Para obter tudo aquilo — e um pátio adequado às manobras —, sacrifiquei uma série de coisas que ainda não tinha aprendido a valorizar. Praticamente não havia espaço para construções e paisagem humana.
Hoje, não tenho espaço nem tempo, como naquela época, e já não poderia investir a mesma parcela da minha renda.
Por outro lado, as exigências que me imponho, hoje, são bem maiores, mais trabalhosas e mais dispendiosas. Em toda minha coleção Frateschi (com algumas peças Atma de museu), não há um único vagão que preencha os requisitos de antiguidade e tamanho reduzido. A locomotiva a vapor também deverá ser bem menor que o novo modelo da Frateschi. Os engates deverão ser Kadee, os truques devem ser Phoenix, o desengate deve ser de ação retardada (DC-5/13) e as bobinas dos AMVs devem ser totalmente escondidas (CT-2/5).
Testei o desengate de ação retardada numa tábua com uma grade flexível sobre 2 camadas de cortiça — mas isso está longe de garantir sucesso total numa maquete para durar alguns anos. Da mesma forma, o projeto do CT-2/5 funcionou bem num dos AMVs 4165 Frateschi do diorama — e falhou totalmente no outro, ref. 4900 (AMV do alto).
Numa grande maquete, tudo isso poderia tomar muito mais tempo. Seria preciso adquirir várias pequenas locos a vapor, construir ou adquirir inúmeros pequenos vagões, um quilo de truques e engates, fazer a instalação, testes, correções etc., até formar uma frota completamente operacional.
Por tudo isso, o diorama me parece uma alternativa milagrosa, capaz de andar muito mais rápido.
E mesmo para quem não se imponha nenhuma destas exigências, o tamanho reduzido pode trazer vantagens capazes de superar muitas das desvantagens. Pense nisso.
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Os desenhos desta série foram feitos especialmente para publicação, com um programa de computador que funciona por matemática — por isso, dá impressão de ser projeto exato, bonitinho. Porém, quase não cito medidas, ao descrevê-lo.
Na realidade, o projeto foi feito a lápis e não cheguei sequer a detalhar as peças de madeira que iria serrar, para formar a estrutura inferior. Para um espaço de 97 x 44 cm, acabei fazendo uma estrutura de 94 x 46 cm — errei ao fazer alguns cálculos de cabeça — e isso não afetou em nada a minha vida.
O próprio traçado que projetei no papel não foi seguido. Na hora, assentei algumas grades flexíveis e AMVs sobre o compensado, até obter um traçado que me agradasse, e marquei com lápis diretamente na madeira, já com a serra elétrica pronta para entrar em ação.
Como minha serra elétrica tem idéias próprias, introduziu mais um ou dois aperfeiçoamentos na maquete real.
Portanto, não perca o sono pensando nas medidas exatas do projeto, nem tenha medo de não conseguir segui-las. Eu, não as segui.
A estrutura de carpintaria, com a base das linhas, foi montada em 2 tardes, no final de 1990. Trabalho devagar.
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